Em preparação para os Jogos de Paris, atletas contam suas histórias e avaliam o movimento paralímpico nacional
Na contagem regressiva para os Jogos Paralímpicos de 2024, o Brasil vai a Paris em busca de mais uma participação histórica. Em 2021, no torneio sediado em Tóquio, o país conquistou 22 medalhas de ouro - o máximo até hoje - e igualou a marca da Rio 2016, quando alcançou 72 pódios. A expectativa do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) é que cerca de 250 atletas sejam convocados para a competição deste ano.
“Acho que os Jogos vão ser tecnicamente muito fortes. O movimento paralímpico aqui no Brasil está crescendo. Acredito que vai se tornar um grande produto para mudar essa cultura de que o deficiente é um coitado”, diz Renato Leite, capitão da seleção brasileira de vôlei sentado.
Pentacampeão parapanamericano e eleito o melhor líbero do mundo após a medalha de prata no Mundial de 2014, o paulista, de 42 anos, começou a praticar o esporte após sofrer um acidente de moto. Em 2002, já com a perna esquerda amputada, fez parte do primeiro jogo de vôlei sentado: “Minha vida voltou desde aquele momento. Foi um recomeço para que eu pudesse viver meu propósito aqui na terra. O esporte me reabilitou”.
Há mais de 20 anos na seleção, ele conta que a preparação para Paris está sendo muito bem feita e que, faltando poucos dias para os Jogos, a ansiedade é inevitável. Com Renato em quadra, o Brasil foi campeão do Parapanamericano em 2023 e agora busca sua primeira medalha de ouro nas Paralimpíadas. A modalidade é disputada por homens e mulheres que possuem alguma deficiência física ou relacionada à locomoção.
Outra representante do país com experiência em Jogos Olímpicos é Vanessa Cristina, de 34 anos, da classe T54 (pista e maratona) do atletismo. Nesta categoria, os atletas usam um tipo de cadeira de rodas com uma espécie de guidão para um melhor direcionamento. Vanessa foi finalista em Tóquio 2020 e segue na expectativa da convocação para Paris.
Aos 24 anos, foi submetida à amputação de sua perna esquerda abaixo do joelho, também por conta de um acidente de moto. Oito meses depois, um professor de Educação Física, que ela não conhecia, a encontrou em um ponto de ônibus e falou sobre o esporte adaptado.
Em Santos (SP), a atleta fez testes na cadeira de rodas em um projeto. Desde então, não deixou mais o atletismo, muito também pela influência das Paralimpíadas no Rio de Janeiro. “Fui assistir, me apaixonei pela prática e falei que queria estar nas pistas em Tóquio”. Torcedora em 2016, ela se tornou finalista nas provas dos 5.000 m e dos 1.500 m em 2021. “Foi a realização de um sonho”, declara.
Nos 5.000 m, Vanessa terminou na oitava colocação e conta que se assustou com a reação negativa dos torcedores brasileiros. “Eu fiz o melhor tempo da minha carreira (11m18s02). Estava muito feliz, apesar de não ter conquistado a medalha. Porém, me assustei vendo as redes sociais porque começaram a cobrar muito. O pessoal mandava ‘meus pêsames’, como se tudo tudo tivesse sido ruim. Comemoramos felizes e, do nada, ficamos tristes por causa disso”.
No ano passado, a atleta teve novos motivos para comemorar: conquistou três medalhas de bronze no Parapanamericano. Para Vanessa, foi um momento mágico na sua carreira e também para o Brasil, uma vez que foi a primeira vez na história em que quatro atletas cadeirantes foram convocados para a competição (dois homens e duas mulheres).
Já Matheus Costa, goleiro da seleção brasileira de futebol de cegos, busca sua segunda medalha de ouro. Embora os goleiros tenham visão total, a modalidade é exclusiva para atletas cegos ou deficientes visuais. O jogo é disputado em quadras ou campos adaptados e as bolas contém guizos internos para que os jogadores a localizem pelo som.
Aos 29 anos, Matheus está confiante para Paris 2024: “Tem sido um ciclo curto, com muitas competições dentro dos anos. Estamos treinando bem e chegaremos muito fortes”, destaca. O Brasil é o atual campeão no futebol de cegos das Paralimpíadas e do Parapanamericano.
Os Jogos começam no dia 28 de agosto e terminam no dia 8 de setembro. A 17ª edição do evento irá reunir mais de quatro mil atletas, divididos entre 22 modalidades. A Globo anunciou que irá transmitir o torneio.
O movimento paralímpico no Brasil
Os três atletas destacam o crescimento do movimento paralímpico no país, tanto da parte de apoio e infraestrutura quanto da visibilidade: “Uma joia em lapidação. Vai se tornar uma grande vitrine para novos patrocinadores”, comenta Renato. No entanto, Vanessa ressalta que, até pouco tempo atrás, as condições eram diferentes.
Ela lembra que a transmissão da Corrida Internacional de São Silvestre, evento realizado anualmente em São Paulo, não mostrava os participantes cadeirantes. “Quando passava a câmera, mandavam a gente se afastar para não aparecermos. Lembro que ficávamos bem chateados. Alguns falavam que nem sabiam que tinha pessoas com deficiência correndo, porque não mostravam”, conclui.
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