Decisão do STF autoriza início de obras do empreendimento na Região Metropolitana do Rio de Janeiro
As obras do Porto de Jaconé, nome mais conhecido dos Terminais Ponta Negra, em Maricá, foram autorizadas no dia 6 de março por decisão monocrática do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF). O projeto tem sido objeto de controvérsia judicial há mais de uma década.
A construção é o maior projeto privado da região e a expectativa é que se transforme na principal âncora para escoamento e tancagem do óleo do pré-sal, produzido na região. No entanto, o porto tem gerado discórdia entre moradores de Maricá e Saquarema. De um lado, a expectativa de desenvolvimento econômico e a geração de milhares de empregos. Do outro, a apreensão com impactos ambientais irreversíveis, que podem colocar em risco a biodiversidade local.
Camila Domit é bióloga e pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde é responsável pelo Laboratório de Ecologia e Conservação, o LEC. A bióloga afirma que o porto pode causar uma série de impactos negativos. Desde dragagens até operações portuárias e navegação de grandes embarcações, os riscos também incluem poluição do ar e da água, alterações sedimentares e perda de biodiversidade, prejudicando pescadores locais e impactando negativamente o turismo.
Segundo a bióloga, a construção de estruturas rígidas, como o píer de atracação dos navios, altera a margem e a dinâmica do mar na área ao redor da costa. “A construção de um porto praticamente redesenha o litoral onde está inserido”, explica Camila.
Essa questão preocupa principalmente pescadores e surfistas que vivem na região. O farmacêutico e surfista Eduardo Frota se mudou em 2002 para Saquarema, município vizinho a Maricá, atraído pelas boas condições do mar para a prática do esporte. Agora, Eduardo teme que a construção do porto possa afetar essas condições. “As praias de Saquarema possuem fundo de areia, logo estão suscetíveis a alterações. Uma obra grande como essa pode afetar o fundo de areia e destruir definitivamente as ondas.”, declarou.
Desde 2017, Saquarema recebe anualmente a etapa do circuito mundial de surf. O evento movimenta mais de R$97 milhões, com impacto de R$35 milhões no PIB da cidade, conforme demonstra relatório da empresa de consultoria Ernest & Young. Frota ressalta: “Sem as ondas e com uma praia suja, não haverá mais campeonato de surf aqui. A cidade sairá perdendo em todos os sentidos”.
A qualidade da água é outro ponto que acaba profundamente alterado em virtude das operações portuárias. Segundo a bióloga, os riscos diários de vazamentos de combustíveis e a queda de produtos dos contêineres que os transportam afetam gravemente o ambiente aquático. Camila lembra que a construção de um porto impacta também a vida animal que está inserida na região.
Disputas judiciais e mobilização popular
Desde 2017, tramita na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) um projeto de lei que determina o tombamento dos beachrocks de Jaconé como patrimônio histórico e cultural, com o intuito de assegurar a proteção da costa. Segundo o projeto, “é dever do Poder Público, com a colaboração da comunidade, promover e proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação”.
O impasse persiste há anos, impedindo que a DTA Engenharia, empresa encarregada do projeto do Porto de Jaconé, possa dar início à construção. No entanto, em 2023, o Instituto Estadual do Ambiente (INEA), após nova decisão judicial, concedeu uma licença favorável à construção do Porto de Jaconé. Pouco depois, em março de 2024, o ministro Flávio Dino rejeitou um recurso do Ministério Público Federal (MPF) contra uma decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) que estabelecia as diretrizes e condições para a concessão da licença ambiental, visando a execução das obras do empreendimento.
Com o intuito de levar a mensagem de preservação ambiental ao público, além de destacar os riscos iminentes do projeto, a comunidade do surf, juntamente com a população local, pescadores e ambientalistas, uniram forças sob o lema “S.O.S Jaconé – Porto Não!”. Ao longo dos anos, diversos protestos foram realizados, inclusive durante a etapa do circuito mundial de surf de 2023, em Saquarema. Nas redes sociais, vozes preocupadas expressam temores de que a construção do porto represente uma ameaça para toda a região.
Ana Claudia Cavalcante é moradora de Saquarema e participa do movimento. Ela ressalta: “Qualquer atividade portuária causa uma série de impactos na sociedade, em termos econômicos, alguns positivos, mas a um preço ambiental e social altos e não compensáveis a curto, médio e longo prazo”. De acordo com Ana, “O porto é a destruição por migalhas. Ele não trará desenvolvimento, só poluição e atraso. A prefeitura deveria investir no turismo e na preservação ambiental. A maioria dos moradores da região vive desse setor. Se nossas praias não forem mais atrativas, perderemos dinheiro”.
Geração de empregos é argumento a favor da construção do porto
Um dos grandes desafios de Maricá para o futuro é a criação de empregos, já que o município, que vive hoje à base dos royalties de petróleo, tem grande parte da população trabalhando para a prefeitura, seja nos órgãos públicos, nas autarquias ou como terceirizados.
Muitos moradores acreditam que o porto irá gerar milhares de empregos e abrirá as portas de Maricá para o mundo. Hênio Silva é morador do município há mais de quinze anos e é a favor da construção. “Não podemos impedir o progresso. Um porto na nossa região vai ser ótimo para o município. Maricá e toda a região receberão um grande estímulo com o progresso deste porto.”, afirmou.
Ao ser questionado sobre o impacto ambiental, Hênio respondeu: “Em relação ao meio ambiente, é claro que existe uma agressão, mas ela pode ser contornada protegendo áreas que não estão sendo protegidas. Se tiver investimento, dá para conciliar as duas coisas”.
Frente às preocupações levantadas, a Prefeitura de Maricá e a DTA Engenharia, empresa responsável pelo projeto, afirmam que o Porto de Jaconé é vital para o desenvolvimento econômico sustentável da região. A empresa assegura que o Terminais Ponta Negra (TPN) visa criar uma infraestrutura para a indústria de exploração de petróleo e gás, com previsão de criar milhares de empregos. Além disso, segundo a empresa, as questões ambientais serão mitigadas por rigorosas medidas de controle e monitoramento.
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