Medicamentos descartados de modo inadequado contaminam sistema de esgoto, solo e lençóis freáticos
Muita gente não sabe, mas jogar no lixo aquele remédio que você não vai mais tomar ou que já está vencido traz riscos graves à saúde e ao meio ambiente. Um medicamento descartado de modo incorreto pode poluir o solo e os lençóis freáticos. É o que alerta a doutora em processos químicos e bioquímicos Mychelle Alves, especialista em saúde pública e do Departamento de Química da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Segundo Alves, é comum que a população guarde remédios por tempo indeterminado e jogue fora irregularmente após o vencimento. E o destino mais comum é despejar tudo no vaso sanitário. Ao chegar no sistema de esgoto, os produtos químicos presentes no medicamento podem se tornar tóxicos ao entrarem em contato com outros componentes biológicos.
A pesquisadora lembra ainda que o sistema de esgoto é cíclico, ou seja, após ser tratada, a água volta às casas das pessoas. Mas, graças a remédios descartados de forma inadequada na rede de esgoto, uma substância química pode se transformar em algo tóxico.
O esgoto contaminado também pode poluir os mares. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informação Sanitária (SNIS), a quantidade de rejeitos sanitários lançados no oceano equivale a cerca de 12,5 bilhões de litros (mais de cinco mil piscinas olímpicas cheias) - e uma parcela significativa destes contaminantes é de resíduos medicinais. Além disso, em 2014 e 2015, a Controladoria Geral da União (CGU) contabilizou mais de 16 milhões de reais em medicamentos despejados a céu aberto.
Estudo da Fiocruz publicado em novembro de 2022 mostra que foram encontrados sete tipos de antibióticos nas bacias hidrográficas de Guandu e São João, no Rio de Janeiro. De acordo com a pesquisadora da Fiocruz, essas estatísticas são graves, porque essas substâncias prejudicam a vida marinha e interferem na pureza dos mares. Muitos animais aquáticos são atingidos por esses resíduos medicinais em degradação.
“Alguns desses fármacos são à base de metais e outros contêm hormônios. Esses componentes podem afetar diretamente a cadeia alimentar, ocasionando uma bioacumulação de metais em peixes. Além disso, a presença dos hormônios prejudica o sistema reprodutor destes animais ou até mesmo acarreta na morte destas espécies”, explica a pesquisadora.
Outra prática comum é jogar no lixo remédios vencidos. Neste cenário, a droga é encaminhada aos lixões e pode se transformar em um agente toxicológico, contaminando o solo e os lençóis freáticos.
“Os fármacos, em contato com as bactérias presentes no ar e em outros dejetos, sofrem uma alteração no seu princípio ativo e com isso geram uma substância, muitas das vezes, tóxica. Isso é prejudicial tanto para os esgotos da cidade, por conta do descarte por meio do vaso sanitário, quanto para os lixões, em virtude do descarte pelo lixo”, comentou a pesquisadora da Fiocruz.
O que deve ser feito
Segundo a pesquisadora da Fiocruz, no Rio de Janeiro não há políticas públicas para evitar o descarte irregular de remédios. Ela lembra, porém, que a própria Fiocruz tem uma rede de coleta de medicamentos: “Precisamos ter políticas públicas que obriguem todas as drogarias e as indústrias farmacêuticas a serem responsabilizadas por esse medicamento que está sendo descartado. Aqui na Fiocruz temos um ponto de coleta”, afirmou.
O município do Rio de Janeiro conta com 333 pontos de descarte de medicamentos. Você pode consultar o mais próximo da sua casa clicando aqui. Para mais informações sobre o descarte responsável e consciente de medicamentos, acesse os sites da Fiocruz e também do Ministério da Saúde.
Comments