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Na Uerj, bolsa grande para poucos, mas atrasada para muitos

Atualizado: 13 de mai.

Manifestações virtuais e presenciais cobraram explicações sobre atraso no pagamento de auxílios e mais transparência em projetos de extensão


Por Guibsom Romão e Sabrina Jacob

Setembro foi um mês conturbado para a Uerj/Foto: Sabrina Jacob

Em meio ao atraso das bolsas estudantis e às denúncias de irregularidades em pagamentos de projetos de extensão, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro viveu um setembro tumultuado. As bolsas de R$ 650, que costumam ser pagas até o quarto dia útil de cada mês, só foram pagas no dia 15. Em protesto, estudantes fizeram no dia 12 uma manifestação na universidade.


Diego Figueiredo, aluno de jornalismo, é um dos milhares de estudantes impactados pelo atraso das bolsas de estágio e auxílios-permanência. Abalado financeiramente e emocionalmente, por conta do atraso, Diego teve que parcelar sua fatura de cartão de crédito para não ter o nome negativado. Morador de Ricardo de Albuquerque, bairro da zona norte carioca, ele estava animado para receber a primeira bolsa do estágio e tinha feito planos com o dinheiro: “Eu precisava muito desse dinheiro, então está sendo bem complicado”.


Moradora de Bangu, na Zona Oeste, Vitória Batista, estudante de Letras, não tem outro sentimento para explicar sua situação que não seja estresse. A aluna precisa do auxílio para custear sua locomoção, que consiste em metrô e ônibus, além da sua alimentação e gastos com materiais, como xerox. Com o atraso no pagamento, ela precisou perder um dia de aula, pois o valor que ela tinha no Riocard não seria o suficiente para ir à faculdade.


Diante das faltas dos alunos, a Faculdade de Formação de Professores da Uerj publicou no Instagram um aviso sobre a decisão do Conselho Departamental da Universidade: “Em virtude do atraso nos auxílios-permanência, foi decidido em Conselho Departamental (13/09) que as faltas a partir do dia 11 de setembro de 2023 serão abonadas”. Vários professores de diversas unidades aderiram, não fizeram chamadas ou abonaram as faltas. Para Vitória, essa atitude não foi tão eficaz: “Eles ainda estão dando as aulas, então perder a matéria também me prejudicaria”.


Jhonata Xavier, aluno de Pedagogia e também morador de Bangu, sentiu o impacto da falta de pagamentos tanto do auxílio transporte quanto do auxílio alimentação. Ele teve de usar o cartão de crédito para cobrir a passagem de trem até a universidade.


Após o feriado prolongado de 7 de setembro, na segunda-feira, dia 11, a PR-4 (Pró-reitoria de Políticas e Assistência Estudantis da Uerj) divulgou nota oficial afirmando que a universidade não recebeu os repasses do Governo do Estado para o pagamento das bolsas e dos auxílios estudantis. Na nota, afirmou estar trabalhando junto ao governador para dar velocidade aos pagamentos.


A reitoria postou, no mesmo dia, um vídeo da reitora em exercício, Cláudia Gonçalves, pedindo tranquilidade aos discentes e afirmando que o governo iria liberar um suplemento financeiro, uma espécie de “empréstimo”, necessário para que a Uerj pagasse todas as bolsas dos estudantes. No dia seguinte, a vice-reitora em exercício, professora Catia Antonia da Silva, afirmou que os valores seriam pagos na sexta-feira, dia 15, o que aconteceu.


Estudantes realizam manifestação contra atrasos das bolsas


Após seis dias de atraso da data habitual do pagamento, centenas de alunos se reuniram no dia 12 de setembro no hall de entrada do campus Maracanã. Cobravam o pagamento da bolsa e providências da universidade.

Manifestação dos alunos no hall da universidade/Foto: Banco de Dados AND

Na manifestação, os estudantes também questionaram as promessas da reitoria e cobraram melhorias na infraestrutura da universidade. Algumas das pautas levantadas durante o movimento foram o auxílio moradia, a construção de uma creche dentro da universidade, o excesso de empresas terceirizadas prestando serviço dentro do campus e o aumento da capacidade do bandejão para a diminuição das filas. A manifestação ganhou o lado de fora da universidade e, segundo o aluno Jhonata Xavier, houve repressão policial com spray de pimenta contra os estudantes. Nas redes, os discentes cobraram ação mais firme do DCE. Dois integrantes do DCE foram procurados pelo Rampas, mas não responderam. O espaço segue aberto caso queiram se manifestar.

Aluno da Uerj mostra sua indignação em rede social/Reprodução: Twitter

Logo após a manifestação na Uerj, começou a circular nas redes a informação de que membros do DCE e de alguns centros acadêmicos, como o Centro Acadêmico de Comunicação Social (CACOS), da Faculdade de Comunicação Social, estavam sendo remunerados por um projeto de extensão.


O Projeto Empoderadas é realizado pela Uerj em parceria com a Secretaria de Governo do Estado do Rio de Janeiro (SEGOV). No site do programa, ele é explicado como uma das iniciativas do Programa Estadual de Enfrentamento ao Feminicídio no Estado do Rio de Janeiro, em conformidade com a Lei Estadual nº 9.985 de 7 de novembro de 2022. Segundo o site, o projeto oferece treinamento em técnicas de identificação e enfrentamento à violência contra meninas e mulheres, além de apoio psicológico, jurídico e social a esse grupo.

Arte do projeto Empoderadas divulgada no Twitter do Governo do RJ/Foto: Governo do RJ

O que chamou atenção dos alunos foi a bolsa paga aos colegas participantes do Empoderadas, no valor de R$ 5 mil. Os estudantes também cobraram mais transparência do processo seletivo e no desenvolvimento do projeto, exigindo que os centros acadêmicos se posicionassem.


Faculdade de Comunicação Social realiza primeira assembleia desde 2020

Assembleia é realizada no curso de Comunicação Social depois de 3 anos sem ter sido convocada/Foto: Pamela Xavier

Com a crise, a gestão (R)EvoluCACOS, do Centro Acadêmico da FCS, convocou uma assembleia estudantil, a primeira realizada desde 2020. Os estudantes fizeram questionamentos às alunas que participam do Projeto Empoderadas e, até aquele momento, integravam a diretoria do Centro Acadêmico. A sala 10.032 ficou cheia, faltou até lugar para sentar.


As dúvidas dos alunos presentes giraram em torno do alto valor da bolsa recebida pelas participantes do projeto, qual a carga horária e o motivo de o projeto ter presença considerável de alunos vinculados a movimentos estudantis próximos do DCE. A falta de divulgação do processo seletivo, de documentos que comprovem a aprovação neste processo e as funções realizadas pelas integrantes foram outros questionamentos. O evento foi transmitido em tempo real pelo Instagram e atingiu um pico de mais de 100 usuários.


As alunas participantes do Empoderadas, segundo registro da ata da assembleia, deram “explicação sobre a origem salarial do projeto e do processo seletivo” e “divulgaram um plano de aula do programa”. As estudantes, com base no artigo 20 do Código Civil, também solicitaram que a live da assembleia fosse retirada do ar, o que foi feito. Durante a assembleia, o único material apresentado pelas bolsistas foi um plano de aula impresso e uma foto que mostra uma delas assistindo a uma palestra do Empoderadas.


Muitos estudantes que compareceram à assembleia, porém, saíram com mais dúvidas que respostas. Pamela Xavier foi uma delas. “Não acho que foi o suficiente para as pessoas simplesmente aceitarem e fim, muito pelo contrário, acho que muita gente saiu até com mais questionamentos sobre esse caso”.


A estudante Maria Luiza Vieira reiterou a visão da colega, pois considerou as respostas “mecânicas, prontas e vazias”. Ela disse que a assembleia foi caótica e sugeriu uma assembleia do DCE-Uerj para tratar do assunto. Para Suelen Cristine, aluna de relações públicas, “a assembleia teve um tom de defensiva da parte da gestão e ofensiva dos estudantes”. Para ela, o evento foi exaustivo, faltando “um ambiente mais receptivo” e “compreensão dos alunos em ouvir e falar”. O desejo, segundo ela, é que as bolsistas do projeto tivessem sido mais transparentes nas suas respostas, porém “algumas coisas elas simplesmente não sabiam responder”.


Houve muitos questionamentos sobre o posicionamento da gestão (R)EvoluCACOS a respeito do projeto, e a gestão atual apenas disse que não tinha noção sobre esse fato.


O repórter Guibsom Romão, do Rampas, solicitou a disponibilização de plano de trabalho do projeto, edital de processo seletivo, convocação das bolsistas, comprovantes de trabalhos ou afins. Durante a assembleia, esses materiais não foram exibidos, mas as participantes do Empoderadas se comprometeram a enviar tudo depois à equipe de reportagem.


O Rampas pediu entrevista a três estudantes participantes do Projeto Empoderadas, sem sucesso. No Portal Transparência da Uerj, onde deveriam constar os documentos legais do projeto, não há informações sobre o Empoderadas.


Não é possível acessar informações sobre o Empoderadas no Portal da Transparência/Reprodução: Portal da Transparência Uerj

No dia 25 de setembro, a gestão (R)EvoluCACOS informou, em nota, que as estudantes ligadas ao projeto não mais integram a diretoria do centro acadêmico de Comunicação Social.


Candidatas à reitoria se posicionam sobre semana de crise

Maria Isabel de Souza, Gulnar Azevedo e Mario Carneiro são os candidatos à reitoria nas eleições de 2023/Fotos: Reproduções da internet

O Rampas entrevistou duas dos três candidatos à reitoria da Uerj, Gulnar Azevedo e Maria Isabel de Souza. As duas reiteraram que os escândalos prejudicam a reputação da Universidade, principalmente quando esta tem sofrido ataques diversos, como o PL 4673/2021, que propõe a extinção da Uerj e foi a votação também em setembro.


Gulnar Azevedo e Silva, candidata à reitoria da Uerj pela chapa 10, lamentou a forma como foram conduzidos os projetos de extensão acusados na “folha secreta”. A médica defende que “a reitoria da Uerj tem que entender que é necessário transparência em todas as etapas do processo nesses projetos”, o que, para ela, não foi feito. Além disso, sobre os auxílios e bolsa permanência, ela reivindica um calendário de pagamentos desses valores. Entende que é uma falha muito grande a inexistência desse calendário, por considerar essas remunerações como “prioridade zero”, a mais importante.


Questionada sobre o atraso das bolsas, a candidata Maria Isabel de Castro de Souza, candidata da chapa 20, disse que ele estava previsto, pois a Uerj já sabia que os recursos acabariam antes do fim do ano. Ela acredita que o orçamento, que já veio abaixo do planejado para 2023, foi mal gerido pela gestão atual. “Poderiam ter se organizado melhor para não afetar tanto os alunos". Sobre os projetos, ela acredita que “precisa ser fiscalizado, algo que não foi feito nos projetos de 2022 e 2023”.


Mário Carneiro, candidato da chapa 30, foi procurado por meio de mensagem no Instagram, mas não respondeu ao nosso pedido de entrevista.


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Diante do clima tenso na Uerj e para evitar qualquer tipo de retaliação, o Rampas decidiu preservar os nomes dos estudantes envolvidos no Empoderadas.

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