Iniciativa da RioFilme resgata espaços tradicionais da cidade
O panorama dos cinemas de rua do Rio de Janeiro está em transformação com a reabertura de dois espaços: o CineCarioca Penha, que foi reinaugurado no dia 28 de setembro, e o aguardado CineCarioca José Wilker, em Laranjeiras, cuja inauguração foi adiada para novembro. Ambos fazem parte do Viva o Cinema de Rua!, uma iniciativa da prefeitura que busca revitalizar espaços culturais, fortalecer a cadeia audiovisual local e ampliar o acesso da população ao cinema, por meio da oferta de ingressos a preços populares, especialmente em áreas com escassez de equipamentos culturais. Desde sua criação, o programa da RioFilme, órgão da Secretaria Municipal de Cultura, já reformou e reinaugurou outros cinemas importantes, como o CineCarioca Nova Brasília, no Complexo do Alemão, o Ponto Cine de Guadalupe e o Cine Santa, em Santa Teresa. A restauração desses cinemas é parte de uma política pública que aposta na descentralização da cultura.
Eduardo Marques, diretor-presidente da RioFilme, explicou, em entrevista exclusiva para o Rampas, que o projeto vai além de restaurar salas de cinema.Ele busca revitalizar o papel social e cultural dos cinemas de rua, resgatando a importância desses espaços como pontos de encontro e lazer comunitário. “A ampliação e modernização das salas de cinema de rua no Rio de Janeiro é uma das metas primordiais dessa gestão", destaca. "O edital 'Viva o Cinema de Rua!' representa a continuidade de uma das políticas públicas centrais para a RioFilme, que é investir na democratização do audiovisual, formando público e apoiando a modernização e a renovação do circuito exibidor de salas de rua da cidade."
O retorno do CineCarioca Penha
O CineCarioca Penha, localizado na avenida Brás de Pina, estava fechado havia quase duas décadas, mas, após um intenso processo de modernização, retorna como uma opção cultural de relevância para a comunidade local. A prefeitura, através da RioFilme, investiu cerca de R$3,5 milhões na reforma de diversas salas de cinema, com recursos provenientes da Lei Paulo Gustavo, uma legislação federal destinada a fomentar o setor cultural no Brasil. O objetivo é tornar o cinema mais acessível para todos, com ingressos populares, visando atender especialmente às áreas de menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da cidade.
Rebeca Melo, moradora da região, afirma que a abertura do cinema é importante para a cultura local. "Aquela área é perto de muitas comunidades, então ela acaba carecendo de locais de fácil acesso à cultura, né? Os dois shoppings dali, que tem cinema, são um pouco distantes. Então você precisa, querendo ou não, gastar dinheiro de passagem. Pra quem mora ali perto, poder só atravessar a rua e estar num lugar que tenha lazer, entretenimento, já é um alívio"
Situado em uma área historicamente carente de infraestrutura cultural, o CineCarioca Penha busca transformar a dinâmica social e cultural da Leopoldina, uma região da Zona Norte do Rio de Janeiro. Essa área possui alto índice de desigualdade, sendo marcada por uma grande concentração populacional e uma expressiva presença de favelas. De acordo com Marques, a reabertura deste cinema pode ter um impacto positivo na vida de milhões de pessoas. "A Penha é parte da 'Área de Planejamento 3' do município do Rio, um pedaço da Zona Norte que detém quase 34% da população da cidade, com cerca de dois milhões de pessoas. A região detém mais de um terço das favelas do Rio, onde vivem cerca de 650 mil pessoas. Esses dados revelam o impacto social e cultural que o CineCarioca Penha tem potencialmente sobre a vida dos cidadãos cariocas que vivem na sua vizinhança”, afirma o dirigente da RioFilme.
Com duas salas de exibição completamente modernizadas, o cinema agora oferece conforto e tecnologia de ponta. E se torna um passo na descentralização do acesso à cultura e na criação de novos públicos para o cinema. "Pra mim é uma forma de frequentar outros espaços, novos ambientes, e ver filmes que eu não consigo ver no cinema convencional, que geralmente são em shoppings. E para ver filmes mais variados, fora da circulação comercial, só na Zona Sul. Do outro lado do túnel, a programação é bem diferente daqui. A gente tem menos acesso", conta Rebeca. O espaço funciona de segunda à sábado, de 13h até 19h, com ingressos à 15 reais. Crianças, PCDs e idosos pagam 12 reais.
CineCarioca José Wilker
Outro espaço aguardado é o CineCarioca José Wilker, localizado em Laranjeiras e batizado em homenagem ao ator e cineasta que presidiu a RioFilme entre 2003 e 2008. A previsão inicial era de que o cinema fosse inaugurado em junho de 2023, mas, devido a atrasos nas obras, a abertura foi adiada para novembro deste ano. O diretor-presidente da RioFilme garantiu que a inauguração em breve será concretizada e que o cinema oferecerá duas novas salas de rua à cidade. "Temos muito orgulho em entregar um equipamento como o CineCarioca José Wilker ao público, ficamos duplamente felizes, primeiro por poder homenagear um artista da dimensão do Wilker, e também, é claro, por proporcionar que o Rio ganhe mais um cinema de rua, com todo o conforto, qualidade e os recursos de acessibilidade que o público merece."
Crise em cartaz
Mesmo com essas reaberturas, o cenário dos cinemas de rua no Rio de Janeiro ainda é desafiador. Nos anos 2000, a cidade tinha aproximadamente 198 cinemas de rua, mas hoje restam pouco mais de 10. Esse declínio expressivo reflete as mudanças nos hábitos de consumo de cultura e entretenimento, com muitos cinemas de rua sendo substituídos por complexos em shoppings ou fechados devido à falta de apoio financeiro.
Enquanto os cinemas em shopping centers tendem a exibir blockbusters e produções comerciais, os cinemas de rua cumprem um papel crucial na exibição de filmes independentes, nacionais e clássicos que ficam fora do circuito tradicional. Eles atuam como espaços de resistência cultural, fomentando a diversidade audiovisual e oferecendo ao público a oportunidade de acessar produções menos convencionais.
O Grupo Estação, que administra o Estação Net Rio, o Estação Net Botafogo e o Estação Net Gávea, é um dos exemplos de como esses espaços podem se consolidar como pontos de exibição alternativos. Por meio de programações especiais, como o "Classiquíssimos", o "Filmes da Meia-Noite" e o "Matinê Estação", o grupo promove filmes antigos, amadores e independentes, dando a chance de novas gerações de cinéfilos conhecerem produções que muitas vezes não estão disponíveis nas plataformas de streaming.
Luz no fim do filme
Atualmente, a RioFilme está focada na seleção de projetos para o programa Pró-Carioca Audiovisual, uma iniciativa que visa promover e fortalecer a indústria cinematográfica do Rio. De acordo com Eduardo Marques, a prefeitura do Rio, por meio da RioFilme, está investindo R$ 38 milhões em mais de 90 projetos ao longo de 2024, incluindo filmes, mostras, festivais e séries, com o objetivo de fomentar o cinema local e gerar impacto positivo na economia. "Estamos todos trabalhando intensamente para que esse processo de seleção das propostas e das contratações se cumpra o mais rápido possível, impactando a economia do município, gerando renda e emprego, e, é claro, potencializando a indústria audiovisual carioca", explicou Marques.
Além das iniciativas já mencionadas, o programa busca impactar tanto a produção cultural local quanto a economia criativa da cidade. Com ações afirmativas e investimentos estratégicos, a expectativa é que o Rio continue se consolidando como um importante centro de produção de conteúdo audiovisual, beneficiando não apenas o público local, mas também atraindo projetos e colaborações de outras regiões do país e do exterior.
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